sábado, 9 de abril de 2011

Cisne Negro: caleidoscópio cartomântico [Parte 2: Self-destruction]



Olá pessoal. Continuando nossas possibilidades de análise do filme Cisne Negro, analisemos agora o background no qual ele se desenrola. Em minha opinião, o self destruction de Nina.
Atenção! Esse texto contém spoilers. Se não viu o filme ainda, assista-o primeiro.


Trailer legendado aqui.

Partindo da perspectiva analisada anteriormente da relação entre Nina e a Princesa de Copas, o background no qual o filme se desenrola é diametralmente oposto ao necessário para a nutrição de uma jovem tão frágil. Como quem desperta de um sonho - a forma como se inicia o filme, por sinal - a perfeição originalmente vista se parte e se estilhaça. E, tal estilhaçar, ao meu ver, se apresenta alegorizado nos espelhos que permeiam todo o enredo.


Os espelhos são naturalmente relacionados com a Sacerdotisa. Como Arcano II, é o reflexo do I, seu duplo e seu oposto; seu complemento perfeito, em essência, que estabiliza sua tendência projetiva inicial. É a relação entre aceleração e atrito.


Explorados à exaustão e sendo os causadores de grande parte dos sustos e surpresas dadas pelo filme, por sua referência direta fui remetido ao filme Psicose. Ao contrário de grande parte dos expectadores, a minha cena favorita é a da mulher ao espelho. Juro que procurei melhores referências, mas os comentadores só citam a cena do chuveiro...


O espelho reflete a possibilidade que temos de vermos a nós mesmos. Não é real, em essência, o que se vê, já que é reflexo e refração de luz de uma forma captável por nossos sentidos; mas é o máximo que nos aproximamos disso nos mais recentes séculos. 
Mas existe uma forma alegórica de espelho, sub-reptícia, metáfora da rede de relacionamentos a que pertencemos, que dá sentido à frase somos fruto do meio em que vivemos. A herança familiar e a convivência alteram a forma como vemos o mundo.


Nina é filha de uma bailarina que, aos 28 anos, se viu forçada a abandonar o ballet devido à gravidez. As projeções desta, portanto, são que Nina siga seus passos, mas não mais que isso. É notável a cena em que, ao trazer um bolo em rosé et blanc para celebrar a obtenção do papel, num ímpeto de fúria decide jogá-lo no lixo. 


O papel que Nina obtém deve-se à aposentadoria (forçada) de Beth MacIntyre, bailarina anterior. Explosiva, impactante, destrutiva; esta é a imagem que a personagem, interpretada por Winona Rider, passa em sua curta aparição. Ídolo de Nina, que furta seus objetos pessoais. Uma forma de se aproximar dela. Uma forma de integrar sua personalidade ao estilo que possui.





Tudo isso motivado pelo implacável e mordaz diretor do espetáculo. Acostumado a relacionar sua sexualidade ao seu trabalho, motiva Nina, já naturalmente competitiva e perfeccionista, a encontrar seu lado mais selvagem, primitivo, volátil, explosivo, intenso e ígneo para interpretar o Cisne Negro. 




Diante da perspectiva de perder seu posto obtido a custa de sangue, suor, lágrimas, ossos deslocados e unhas quebradas, Nina mergulha de cabeça no que seria a maior aventura de sua vida. Talvez, a única.
Talvez.


A experiência atemporal desse mergulho não nos permite antever, no decorrer do filme, se Nina havia tido vislumbres do seu lado sombrio. Vê-se a dificuldade encontrada para o toque em seu corpo. Talvez, ou justamente por isso, sua coceira destruidora. Sua pele lacerada é o matiz rubro da necessidade de contato. Onde há dor, há, paradoxalmente, prazer, em dicotômica relação de busca do Outro, no caso, idealizado e distante, assim como necessidade de destruir esse mesmo Outro que, próximo demais, a desvia do seu foco e libera, mesmo que por instantes, um instinto aprisionado e urrante. 




Desde a mordida inicial, até o corte das unhas - uma das cenas mais impactantes, culminando no assassínio da imagem, que, facelada, libera finalmente  o alimento necessário à manifestação plena da Sombra.




Quanto mais destruída, destroçada, facelada, esfolada, arranhada e ferida, quanto mais exposta é sua dor pela ausência da plena perfeição, mais próxima ela se vê dessa mesma perfeição, elevada ao limite da existência. 
Já havíamos visto isso antes, por aqui, quando eu citei o Fight Club. No extremo, no limite representado pelos Dez yang - Paus e Espadas - somos obrigados ao Salto. Naipes projetivos nos impelem para a frente... mesmo quando o "para frente" é uma parede de tijolos.
Abraços a todos, até o próximo post.




3 comentários:

  1. *-*

    Foi um prazer inenarrável assistir esse filme com vc!
    Temos que ver outras vezes!
    Foi um filme que me deixou "pensando" como poucos.

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  2. Preciso mesmo ver esse filme... acho que fiquei pra trás!

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  3. Oi Nara. Claro, encontraremos também outros filmes tão bons quanto esse, mas esse vale mais de um replay!
    Pietra, ASSISTA. Assim mesmo, no imperativo, em caixa alta. E tem mais postagens sobre o Cisne Negro por vir.
    Grande beijo meninas!

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Quando um monólogo se torna diálogo...