"Somos tarólogas e tarólogos. Quer dizer, só tarólogas? Definitivamente, não! Em nosso mundo existem pessoas que são muito sintonizadas com o Universo que nos cerca e que conseguem, através de diversas ferramentas compreender o andar da Natureza e aprender mais sobre si. São os oráculos e, com eles, a voz do divino. Assim, agora, queremos saber: Quem fala com você?"
Novamente, a convite da Pietra e da Luciana, estamos diante de um desafio. Sincronicamente, recebi o convite em uma postagem em que falava justamente sobre o Hierofante, a carta eleita para ilustrar a blogagem coletiva. No Housewives, o Hierofante é representado pelo rádio - intermediário entre o ouvinte e o mundo, num momento em que a internet não era nem um embrião de um sonho. Ou será que... deixa para lá.
A propósito, adorei o tema dessa postagem. Afinal de contas, quando penso em oráculos, penso, imediata e invariavelmente, em minhas cartas. São parte de mim e parte do que desejo que continue sendo parte de mim, partindo do pressuposto que nem sempre somos o que gostaríamos de ser.
Contudo, no decorrer do meu treinamento e do meu desenvolvimento, me vi às voltas com outros oráculos também, e todos eles foram fundamentais para que hoje eu pudesse desenvolver o olhar que possuo sobre a própria prática da Cartomancia.
Tentei as Runas. Não me adaptei à mitologia relacionada. E, talvez por falta de treino, não enxerguei com elas coisas que estavam debaixo do meu nariz. Ainda as utilizo, em rituais como símbolos e na divinação, mas apenas para mim.
Tentei a Quiromancia. Foi engraçado, porque funcionava de forma absurdamente diferente da Cartomancia; era muito mais tátil que visual, era quase psicometria! Mas eu encontrei alguém cujo Caminho é este, e lhe repassei meu material. Ainda acho interessante conhecer, mas não profissionalizar.
A bola de cristal foi mais interessante ainda (ou deveria dizer... engraçado?). Não tive paciência de esperar as Visões. O baralho é pá pum, embaralha sete vezes, corta três, reúne os montes, vira a de cima; pronto!
Vamos falar então do que eu amo... os baralhos!
Etimologicamente, "Cartomancia" é a advinhação (mancia) com as cartas de baralho. Isso nos abre um leque de possibilidades à luz do mercado editorial contemporâneo. Originalmente, o que diferenciava os baralhos era a interpretação artística, regionalizada, reflexo das mentalidades e costumes do período. É importante ressaltar que utilizo "reflexo" na acepção de Ernst Gombrich - uma ilusão visual (neste caso, comportamental) que gera um efeito mensurável. Temos essa possibilidade de mensura nos diversos baralhos que sobreviveram ao tempo e ao uso, entre Tarots e baralhos específicos para leitura de sorte ou para as mesas de jogo - senão para ambos.
Atualmente, temos tantos baralhos quanto é possivel imaginar. Promocionais, temáticos, turísticos, para coleção, adivinhatórios, divinatórios, terapêuticos, para meditação. Sendo assim, o que definiria um baralho, em síntese? Um grupo de imagens, reunidas de forma premeditada ou não - as imagens podem ser agrupadas de acordo com critérios que não são, a priori, "lógicos" -, que possuem dimensões passíveis de serem embaralhadas, homogêneas entre si. Não é possível um baralho de dimensões variadas, pois o conjunto não seria coeso em um leque.
Os critérios para reunião das imagens das cartas em um baralho são, geralmente, temáticos: naipes, signos, formas, cores, títulos. No caso do Tarot, por exemplo, temos três características agregadoras: o nome/título, o número e os elementos afins, em alguns casos, formas, em outros, cores. Por exemplo: não importa o Tarot, sei que um Sete de Paus (nome) possuirá sete (quantidade/número) paus, varetas, cetros, clavas, bastões (forma). Além disso, poderíamos ter, como no Thoth Tarot, um título (Coragem), apontando para o conteúdo divinatório. como tradicionalmente os Paus são ligados ao elemento Fogo, encontraremos, na maior parte das vezes, amarelos, vermelhos e verdes em sua paleta de cores.
Além disso, saberemos que se tivermos mais ou menos Paus em uma carta, estaremos lidando com o mesmo conteúdo temático em uma outra esfera. E desta meditação começamos a interiorizar as possibilidades interpretativas de cada carta.
Os baralhos comuns são reunidos pelos signos (sinais) correspondentes a cada um dos quatro naipes. O Petit Lenormand, pelo número e pelo naipe correspondente. Falando nisso, o Petit Lenormand é um caso interessantíssimo, pois não há uma relação coesa entre os naipes e a numeração. E, no desenvolvimento de sua iconografia, aos poucos foi-se perdendo o referencial na cartomancia (aqui diretamente relacionada ao baralho comum) e apenas a numeração foi mantida. Temos aqui os baralhos de Katja Bastos e J. Dellamonica, que são, até onde eu sei, os mais conhecidos por aqui, no Brasil.
Mas não só os temas desse blog que são temas para baralhos, não (e, de certa forma, vice-versa: nem todos os temas de baralhos são temas para este blog.). Já vi baralhos próprios para a divinação com as Runas. Baralhos que se relacionam com o jogo de búzios. Baralhos que se ligam ao I Ching. Baralhos ligados à Wicca. Baralhos ligados à Cabala, seja relacionado à letras hebraicas, seja ligado aos Anjos Cabalísticos. Baralhos ligados a pesquisas específicas, como o do Dr. Masaru Emoto, de Cristais de Água, e o de Neide Margonari, de Florais de Saint Germain; nem todos se prestam a divinação. Os últimos certamente servem para a meditação e interiorização. Mas, o que dizer do baralho de Runas?
Fui atrás, de novo e outra vez, da Amanda Izidoro. Ela me disse que não há diferença na resposta do oráculo, ainda que o método seja diferente. E que, por vezes, o fato de ser um baralho facilita, e muito, a obtenção da resposta.
Eu, particularmente, não gosto. O ritual rúnico se adequa mais às pedras que às cartas, em minha modesta opinião. O mesmo diria do I Ching: acho que as moedas já foram uma revolução e tanto, em relação às 49 varetas originais. E funcionam, e são versáteis, e pronto. Eu ainda bato bolo com colher de pau, olhando torto para a batedeira... Embora já tenha atendido clientes com Tarots virtuais! Mas isso é outra história.
Acredito na experimentação das imbricações entre técnicas de um e significados de outro oráculo, mas, por serem justamente experimentações, nem sempre funcionam. E é isso que devemos ter em mente quando as utilizamos. Não é o oráculo que é complicado, é o método que é inadequado, mas só percebemos isso de maneira empírica. Mas, na falta do método original que considero sempre mais adequado (acho que ninguém aqui vai deixar de jogar runas se as runas não forem de pedra ou osso), o oráculo funcionará perfeitamente como deve ser.
Concluindo e respondendo a pergunta que motiva essa postagem, quem fala comigo é o baralho. Em suas múltiplas e caleidoscópicas apresentações, ele fala. Até mesmo quando eu não gosto da roupagem que veste, ele fala. Até mesmo quando não gosto do seu sotaque, ele fala.
Que bom que a gente conversa.
Referências bibliográficas:
GOMBRICH, E. H. Arte e ilusão: um estudo da psicologia da representação pictórica. São Paulo: Martins Fontes, 2007.