quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Conversas Cartomânticas: Adash Van Teufel e o Happy Squirrel


Olá pessoal. É realmente engrandecedor, para mim, ver que chegamos tão longe. E se "vê mais claro quem vai longe", creio que todos aqueles que nos acompanharam, vinte e quatro escritores, cento e sessenta e cinco seguidores, todos amantes do Tarot, estão certamente vendo mais ao longe, como eu mesmo.  Nesses meses em que o grupo Tarologistas tem se mostrado efetivamente atuante no Facebook, o quanto eu cresci, o quanto eu acresci às minhas práticas cartomânticas!
Depois de passarmos pelos 22 Arcanos Maiores, cá estamos diante da maior avant garde da pós modernidade no que concerne ao Tarot. Temos diversos baralhos que buscam acrescer Arcanos dentro de sua estrutura pessoal, sem, no entanto, causarem grandes reflexões para além daquelas próprias do seu grupo de estudiosos. Falei um pouquinho sobre isso quando relacionei a carta do Mestre, no Osho Zen Tarot (Pensamento-Cultrix) a esse fenômeno - para mim, Osho se enquadraria no Arcano V e tranquilo, não precisaríamos ir além disso. Até aí tudo bem. O Happy Squirrel, em contrapartida, não partiu de um estudo sistemático dos Arcanos ou da proposta de uma escola iniciática (a não ser que você considere Os Simpsons como uma escola iniciática, risos). E, pelo número de baralhos que o têm incluído entre os Maiores, merece seu lugar na reflexão que propomos aqui. A Tradição foi vista, reflitamos sobre os acréscimos pós modernos também.
E quem se dispôs a enfrentar o desafio foi o tarólogo Adash Van Teufel. Acompanhemos seu raciocínio rascante e divertido - muito adequado a um Arcano (estou realmente me degladiando com esse conceito para referir-me a essa carta) que bagunça o coreto todo, deixando o Louco pensativo sobre seu próprio papel.

Adash Van Teufel, por ele mesmo:

Gosto de pensar na vida como sendo uma tela em branco, disposta a receber a tinta que eu queira depositar nela. 
A técnica usada para pintar representa o caminho a ser trilhado. Os pincéis são as ferramentas que uso e as tintas  uma expressão peculiar das escolhas que tomo.
Enquanto as pinceladas vão compondo paisagens, o traçado e estilo são minha personalidade. E cada composição única se reflete na obra pronta - as conquistas - cuja assinatura final é o reflexo do que aprendi neste processo.
Meu caminho, por natureza, é o do Mago, andando no limiar que separa e une os dois mundos. Meus pincéis são o tarô, a cabala e os florais, que, unidos, traçam o panorama existencial a ser seguido. As tintas são escolhidas à partir da observação conectada à realidade ao meu redor e compõem, para cada caso, uma palheta de cor. Entre o pensar e o sentir, prefiro o sentimento, a percepção e intuição. A espontaneidade é aquilo que traz sentido ao meu estúdio.
Desde 1990 estudo a arte de viver. Sou tarólogo, terapeuta e espiritualista independente. E ainda pretendo pintar muitas outras telas. 
Contato: Através do blog Studio Tarot. 


Você conhece o Esquilo Feliz?

Tudo começou com uma brincadeira no seriado americano Os Simpsons, satirizando o poder das vidências. Eis que no episódio do "Casamento de Lisa", Lisa adentra uma tenda e encontra uma vidente. O diálogo a seguir é tradução livre, do original:

Vidente: Estava te esperando, Lisa.
Lisa (arfando): Como você sabe meu nome?
Vidente: Seu crachá ("Oi, eu sou Lady Lisa"). Você gostaria de saber seu futuro?
Lisa: Eh, desculpe, eu não acredito em adivinhação. Estou saindo.
Vidente: O que te preocupa? Bart, Maggie e Marge estão na competição e Homer está perturbando a mostra de filhotes.
Lisa (arfando): Uau, você consegue ver o... presente.
Vidente: Agora vamos ver o que o futuro carrega. (Ela vira uma carta do que parece ser um baralho de Tarô e aparece a Morte)
Lisa (engolindo seco): A carta da "Morte"?
Vidente: Não, isso é bom: significa transição e mudança.
Lisa (aliviada): Oh.
(A vidente vira outra carta com a imagem de um esquilo)
Lisa: Oh, que fofo.
Vidente (arfando): "O Esquilo Feliz"!
Lisa (acanhada): Isso é ruim?
Vidente: Possivelmente. As cartas são imprecisas e misteriosas.

O curioso acerca da sátira em questão é que a carta do Esquilo Feliz (The Happy Squirrel Card) vem impressa no desenho com o número romano XXIII, sugerindo como se fosse um arcano maior do Tarô. O Tarô possui 22 arcanos maiores e 56 menores, até então nunca houve referência à existência de um 23º arcano. Até então!
Não fosse o fato de ser apenas uma brincadeira, o número 23 tem todo um mistério associado a ele. Segundo a Wikipédia, existe uma certa obsessão com este número em função de estar associado com fatos e incidentes, tornando-se com o passar do tempo uma espécie de lenda urbana.
 O 23 é associado pelo "Princípio da Discórdia" [1] com a Deusa Éris (Salve Éris!). Éris é na Grécia a Deusa da Discórdia, mãe das abominações, tendo parido a fome, a mentira, a pena, o esquecimento, a dor, as disputas, batalhas e matanças, os massacres, ódios, ambiguidades, desordem, ruína, insensatez e ao juramento, este causando problemas ao homem quando perjura voluntariamente.
À parte a mitologia, com Éris não se brinca. Tive a oportunidade de conhecer em 2010 um devoto de Éris em um grupo de estudos de ocultismo em que, cada vez que ele se fazia presente, começava a haver uma discussão caótica e desordenada, aonde todas as pessoas presentes falavam tudo ao mesmo tempo, numa velocidade impossível de acompanhar e por consequência, diálogo e entendimento encerravam-se no caos.
 OK. Mas o que tem em haver Éris com o Happy Squirrel e o diálogo de um episódio dos Simpsons de meados de 1990? Simples, artistas criadores de Tarôs e tarólogos não deixaram por menos a sátira, trollando os Simpsons. Criaram o Arcano 23, a Carta do Esquilo Feliz e esta hoje faz parte de alguns Tarôs, como o Victoria Regina (na versão on-line), International Icon, Touchstone e mesmo o Shadowscapes ganhou sua versão do esquilo.
 Claro que um tarólogo sério retiraria a carta do baralho de Tarô. Afinal, é uma brincadeira, uma homenagem. Mas, eis que o 23 veio para fazer suas peripécias. E as consequências, óh Éris, é que alguns resolveram se aventurar a deixar a carta no baralho em suas tiragens. E agora? Seremos levados ao discordianismos sobre seus possíveis significados? O que signifcaria a carta do esquilo?

Parece que a bênção de ter o adjetivo "Feliz" associado ao nome, fez o esquilo surgir nas tiragens com significados inusitados. Nos fóruns de discussão, como o Aecletic Tarot, associou-se automaticamente a idéia do esquilo com as nozes. No idioma inglês, a palavra nozes é nuts, que é comumente usada como "maluco", com os participantes discutindo alegremente sobre a carta deixá-los malucos!
He's nuts - Ele está doido! Epa! Tropeçamos no Louco? Não pode! O Zero ou o Sem-Número já tem o seu próprio sentido e seria o esquilo aqui um "ladrãozinho" de significado? Óh não, pelo amor de Éris, ladrão é um atributo negativo do Mago! Eu acho melhor irmos por outro caminho pra tentar chegar ao significado do Esquilo Feliz.
Então a melhor forma seria avaliar a carta a partir dela mesma, já que não está no Tarô clássico e nem tem tradição a seu respeito. Vou basear-me na imagem desenhada por Stephanie Pui-Mun Law, em seu Shadowscapes Tarot. No seu melhor estilo fantástico de fadas e anjos, Stephanie desenha a visão surreal da carta "imprecisa e misteriosa", com todo um entorno impreciso e misterioso que circunda uma árvore, onde o Esquilo Feliz olha em direção a uma fenda na árvore, que está cheia de nozes e ao mesmo tempo dos naipes do Tarô. Uma espada, um bastão, uma taça e um disco entre as nozes sugerem que o esquilo os estocou junto ao seu alimento.



A visão da Stephanie sugere um esquilo florestal. Este, na realidade, compreende 122 espécies de esquilos da família Sciuridae, roedores de hábitos diurnos, dividindo-se em 5 subfamílias diferentes e a partir daí existem diversos gêneros. Estes esquilos possuem sentidos bastante apurados e sua anatomia é adaptada à vida nas copas das árvores, local onde buscam segurança e refúgio de predadores terrestres.
Eles descem ao solo somente pra procurar alimento ou buscar aqueles que já tenham armazenado (enterrado na floresta), para isto, estão atentos aos menores ruídos e movimentos, pois esta prevenção lhes é vital. Possuem presas fortíssimas, roendo sementes com facilidade, como pinhão, nozes e coquinhos. Muitas vezes, enterram as sementes que coletam e com isto algumas acabam por germinar. Também se alimentam de frutas e pequenos insetos. Um detalhe interessante e que não passou despercebido por Stephanie é o fato de que aves, especialmente os corvos, podem observar o esquilo enterrar uma semente e, tão logo o esquilo saia, desenterrá-la.
Na sua convivência com humanos, são ditos como animais inteligentes e persistentes. Usam métodos inteligentes para contornar obstáculos e comer de alimentadores de passarinhos. Se treinados como pets, podem ser tão inteligentes quanto cães para aprender truques e comportamentos. Procuram estocar comida para os períodos de privação, portanto eles vão estocar tudo o que estiver disponível. Os que vivem em parques aprenderam que humanos são fontes de comida e se aproximam com facilidade, principalmente atraídos por flautas, harpas, gaitas e sons de gemidos. Porém, se um dia você avistar um, não lhe dê amendoim nem semente de girassol, pois isto pode lhe acarretar doenças.
Seria então a carta do Esquilo Feliz um aviso acerca dos perigos dos corvos que querem roubar aquilo que nós reservamos e guardamos para depois? Ou, como a vidente dos Simpsons, na sua expressão assustada, avisar que é preciso estocar para um grande período de privação que logo vem pela frente? Isto até poderia fazer sentido, afinal, quem guarda tem, diz o velho ditado. E o esquilo é feliz porque estocou alimento, prevenindo-se, e, com seus sentidos aguçados, nos alerta para não nos colocarmos em risco a menos que tenhamos inteligência suficiente e esperteza para nos pormos em segurança caso ocorra uma situação de perigo.
Assim, o Esquilo Feliz aprendeu em todos os arcanos maiores a se precaver e estando no final, em posse dos ases-elementos com seus mantimentos, venceu o 23 de Éris e seus filhos nada sadios que o atacaram, como numa mensagem de que o Tarô nos ensina a vencermos nossos maiores desafios com inteligência e perseverança?
Mas eu acho que não e que isso seria uma grande bobagem. Creio que o espírito do Esquilo Feliz surge como uma brincadeira, apenas para aguçar a curiosidade e de fazer piada com um medo que todos nós, estudantes sérios do Tarô temos. O medo de termos nossa seriedade questionada.
Todo o tarólogo legítimo estuda seriamente a estrutura, o simbolismo e os significados. Informa-se, faz cursos, lê livros, faz leituras para aprender e testar suas interpretações. Alguns se profissionalizam, criam uma identidade e começam a lidar com a visão de seu próprio nome estampado nas propagandas que seus próprios consulentes fazem e para tudo isto é preciso seriedade, pois um passo em falso e toda uma dedicação vai por água abaixo. O esquilo, assim, se torna uma representação da nossa própria fragilidade onde qualquer predador em terra pode, como uma serpente, nos privar do nosso "eu tarólogo" num instante.
Então o Esquilo Feliz é uma forma de lembrarmos do lado lúdico do Tarô. O de ser apenas um maço de cartas. E assim entender que, com excessiva seriedade, nossa própria vida pode se tornar rígida e restritiva, privando a nós mesmos dos prazeres que o adjetivo "feliz" do esquilo vem nos lembrar. Afinal, quando tudo começou, quando sequer sabíamos o que eram as figurinhas enigmáticas do Tarô, o que nos moveu a aprender foi curiosidade, foi dinamismo, foi um interesse vivo que se divertia enquanto descortinava verdades que mais tarde tornaram-se visões.
Predadores existem sim. Se nossa constituição pode parecer frágil, seriam os esquilos (nós), incapazes de lidar com as serpentes? Eu acho que não. E eis o próprio esquilo in nuts mostrando pra nós a que veio. Acesse o vídeo aqui.
Encare este espírito do Esquilo Feliz. E aqui deixo o meu desafio. Vivencie-o em você e no seu Tarô. Olhe-o e colha, em cada um dos outros 22 arcanos maiores, suas sementes. Quais sementes você coletaria? Pense bem, para não tornar sua vida "imprecisa e misteriosa"!

_______________
[1] - Escrito por Gregory Hill e Kerry Thornley, publicado em 1965, é um texto sagrado ao Discordianismo, uma antítese dialética às religiões e estabelece que "todas as coisas acontecem em cinco, ou são divisíveis ou multiplicáveis por cinco, ou estão de certa forma direta ou indiretamente ligadas ao 5." Logo, o 23 resulta em 5 se somarmos seus dígitos e deste modo é atribuído a Éris.

4 comentários:

  1. Emanuel,

    Obrigado pela oportunidade de apresentar meu texto em seu blog!

    Espero que os leitores apreciem esta gostosa brincadeira que foi trabalhar o Happy Squirrel!

    Abraços,

    Adash

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  2. Ameeeei o texto, pra alguém como eu q está começando seus estudos agora está sendo combustível de reflexão, ainda mais no meu caso q já trabalho com as Runas, estou fazendo um paralelo entre o "Esquilo" e uma delas, assim q me esclarecer melhor, te conto!
    Beijus

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  3. Agora você precisa convocar mais pessoas para falar de cada um dos arcanos menores e ai publicamos, mesmo que só virtualmente, um livro coletivo com tudo isso!

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  4. Olá Adash. Eu é que me sinto grato pela sua participação e empenho em verticalizar um Arcano tão misterioso, tão pós moderno.
    Babi... Ah que eu quero saber! :D
    Filhote de Lua, aguarde novidades para breve! ;)

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Quando um monólogo se torna diálogo...