sábado, 23 de julho de 2011

Descanse em paz, Rainha de Copas. Sobre os padrões.




They tried to make me go to rehab
But I said 'no, no, no'
Yes, I've been black, but when I come back
You'll know-know-know

Amy Winehouse, Rehab

Bad news, pessoal. Amy Winehouse faleceu. É uma perda para o Jazz, para o Soul e para o R&B. É engraçado como a nossa relação com a morte, enquanto pertencentes a uma sociedade cristianizada e ocidental. Parece-nos que a perda valoriza aquele que parte, sendo que, de fato, a pessoa viva teria muito mais possibilidades de nos oferecer surpresas. A Morte "fecha o pacote", deixa completo o que poderia ter estado inconcluso até o momento. Além do que, para uma sociedade comercial como a nossa, que vive da exploração da memória, a cada ano que passa a biografia de um popstar ganha em possibilidades explorativas. São DVDs, CDs, pôsteres, camisetas, pulseirinhas, bala de goma... Comemorando o fim. Uma macabra epítome. (thanks, Leo Dias, pela apresentação do termo)
E, acompanhando as postagens no Facebook, percebi o quanto as pessoas se ligam em padrões. No caso, as mortes aos 27 anos.  
Desde que o mundo é mundo nos ligamos em padrões. De cores. De formas. De comportamentos. De possibilidades. Os padrões externos norteiam nosso próprio comportamento em dadas situações. O que não se pode confundir é um padrão com um sinal - o que, raramente, ocorre simultaneamente. 
Por exemplo, eu sei que não posso atravessar a rua no sinal vermelho. Esse é um padrão aceito pela sociedade como sinalizador de um acontecimento - quando o semáforo acende a luz vermelha para os pedestres, os carros podem passar e vice-versa - mas não posso tomá-lo como um sinal, só porque, uma vez, eu encontrei uma amiga querida que não via há muito tempo justamente porque não pude atravessar, graças ao semáforo ter mudado de cor.
Imagine se eu ficasse esperando no semáforo que a mesma situação ocorresse toda vez que o sinal ficasse vermelho...
Bem, de acordo com a matéria supra linkada, a morte aos 27 anos é uma "lenda que assombra o mundo do rock desde os anos 1970, quando morreram Jimi Hendrix e Janis Joplin, por overdose, Jim Morrison, do The Doors, de causa não esclarecida, e Brian Jones, do Rolling Stones, por suposto afogamento.
Duas décadas depois, Kurt Cobain, líder da banda Nirvana, passou a integrar essa trágica lista após se suicidar. De acordo com familiares do roqueiro de Seattle, desde criança ele falava do sonho de participar do clube, que inspirava a ideia de morrer jovem depois de viver intensamente."
Certamente, antes Brian Jones e do Kurt Cobain, alguém deve ter tido a "excelente" ideia de manter o padrão de pessoas com "J" aos 27 anos.  Depois do Brian Jones, só sobrou a idade. E percebamos, com o texto, que depois de correlacionadas as mortes de algumas personalidades, houve uma tentativa voluntária de aproximação desse "ideal de vida" pelo Kurt Cobain. 
E agora, Amy Winehouse. Fora o fato de ter um estilo de vida semelhante ao dos supracitados, não há nada que os correlacione. A idade de morte? Semáforo vermelho. Poderia estar verde.  


Ok, reitero o que disse acima, padrões nos deixam confortáveis. E são funcionais, dentro do seu sistema de funcionamento. Mas não deveriam ser utilizados levianamente como sinais. Caso contrário, nos tornamos escravos do nosso passado e incapazes do novo no presente, já que, de alguma forma, os sinais que recebemos dialogarão diretamente com nossos atuais passos. 
Não poderia, portanto, interpretar a carta do Louco, no Tarot, ou da Cegonha, no Petit Lenormand. Elas perderiam todo o seu sentido específico e ganhariam outro, que eu não sei o quão efetivo seria. Estamos lidando com o novo, nessas cartas. Estamos lidando com a novidade, não com o mais do mesmo; com o inusitado, não com o revisitado! 
Esse é o caso também de muitas pessoas que procuram o oráculo. Depois de sonhos repetidos, depois de situações parecidas ou de encontrar pela oitava vez consecutiva uma pessoa de determinado signo, vêm ao oráculo para buscar confirmações às suas suposições. Mas, até que ponto a repetição incorre em lição? Até que ponto o coração se sente incomodado com tais digressões? Até que ponto a repetição incorre em estímulo? São esses os pontos, que a meu ver, tem importância, para além do acontecimento, per se.


Não me interesso em padrões rasos de morte. Estou interessado em padrões de comportamento, que nos permitam maior profundidade, maior entendimento, maior autocrítica.. É uma pena termos perdido Amy Winehouse, mas cada um no seu quadrado e cada qual no seu balaio, please. A morte já é dolorida demais para virar padrão além do que ela já é - para morrer, basta nascer.
Às vezes, nem nascer.
Abraços a todos.

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