Com esse mote, retirado do Eclesiastes, toda uma categoria de obras de arte - as Vanitas - fizeram-se presentes, sobretudo no Barroco. E esse é um dos vícios capitais (nova nomenclatura para os antigos pecados capitais) mais curiosos de se estudar e mais recorrentes como chamados para a aventura, dentro da perspectiva do monomito, que estamos estudando na Jornada do Louco em sua Autodescoberta).
Estava eu procurando uma imagem para ilustrar a carta Soberba, dos Sibillas - como o Sibilla Della Zingara - e acabei me dando conta que esse tema perpassa todos os oráculos cartomânticos sobre os quais já conversamos. Não estou, necessariamente, falando do conceito de soberba/orgulho/vaidade, mas sim da representatividade pictórica do mesmo. Acho que essa conversa dá pano para manga, para mais de um artigo; gostaria de falar hoje sobre um insight em especial, que fez toda a diferença.
Reparem nas obras a seguir (que foram retiradas deste blog e reorganizadas para nossa argumentação).
Abraham Mignon (1640-1679)-'a Natureza como um símbolo de Vanitas'- óleo sobre tela. (1665-1679) Darmstadt-Hessisches Landesmuseum
A primeira obra que temos aqui diz muito pelo título, e é uma das mais curiosas. Assim como as naturezas mortas, aqui temos a evanescência da vida retratada em sua magnitude e aparente perenidade. Tudo é passageiro, tudo nos toca. O imutável é a mutação, e o mutável nos muda, nos revolve. Repare, portanto, na natureza como referência em sua vida e impermanência ao conceito de Vanitas.
Cace no[s] seu[s] baralho[s] referências a essa frase.
Pieter Claeszoon (1597-1660); anteriormente atribuído a Clara Peeters (fl 1607-1621)-'vanitas ainda vive'- óleo sobre painel -1630 The Hague-Maurithuis
Essa imagem é uma das mais icônicas da ideia de Vanitas. A caveira, símbolo da finitude humana e do nosso resto e pó diante da Eternidade. Da personalidade nada sobra; de lembrança, um osso. Apenas. Aparece em muitas imagens de santos, como sua disponibilidade em desapegar-se definitivamente de sua vida pregressa. Encontramos aqui novas referências. Cacemos em nossos baralhos.
Adam Bernaert (trabalhou no período entre 1660-1669)-'vanitas'- oleo sobre painel- cerca de 1665. Mount Vernon-Walters Art Museum
Essa obra, por sua vez, já nos traz um cenário mais intimista, cuja natureza nos leva ao Vanitas mas suplanta o primeiro significado de efemeridade. Aqui temos as obras humanas que suplantam sua própria existência. Tudo muito belo, mas que só tem sentido e significado com o reconhecimento do indivíduo - e isso me lembra as lágrimas de Alexandre. Sim, cacemos nos nossos baralhos.
Antonio de Pereda (1611-1678)-'Alegoria da Vaidade'-(1632-1636). Wien-Kunsthistorisches Museum Gemäldegalerie
Essa imagem me atraiu muito - sobretudo pela presença de um baralho espanhol aqui no canto inferior direito. É divertido perceber o uso desse baralho que, a despeito de seu pouco conhecimento cá no Brasil, tem sua referência, representatividade e uso. Buscamos apresentar um pouco dele em um artigo para o Clube do Tarô, mas existe muito, mas muito mais, por fazer. Mas temos as cartas não em seu sentido adivinhatório, mas como alegoria do jogo - as moedas que lhe ladeiam atestam o fato. Já apontei algumas prerrogativas diretas, encontremos outras em nossos baralhos.
Pieter Boel (1622-1674)-'Vanitas- alegoria das vaidades do mundo'- óleo sobre tela -1663 Lille-Palais des Beaux-Arts
Por fim, a imagem que me incentivou a escrever esse artigo. Aqui, tudo é metáfora, compondo uma alegoria complexa e passível de diversos níveis. Tudo é deliberado, nada inocente, para uma leitura que demandasse horas de educação visual. Mas aos meus olhos evidenciou-se a ideia de um arcano específico do Tarot.
Vanitas Vanitatum. Tudo é vaidade aos olhos de Il Tredici. Olhe o que ela ceifa. Não cabeças de um rei e de um plebeu. Ceifa metáforas. Ceifa qualquer um que vista a carapuça.
Conte para mim nos comentários quais mais referências ( e a quais baralhos) você encontrou. Acredito que temos muito mais a ver, ainda.
Abraços a todos.
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