sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Níveis de leitura das cartas


Olá pessoal. Muita gente acha que para ser cartomante é necessário ter um "Dom", ou coisa que o valha. Não concordo muito com isso. Acho que o dito "Dom", na verdade, corresponde a níveis de sensibilidade às imagens que compõem o oráculo. Por analogia, peguemos o xadrez: qualquer um pode aprender os movimentos, a disposição das peças, mas só alguém com vocação para enxadrista vai ter boa vontade e paciência para ficar horas bolando estratégias e revendo movimentos. Ou andar de bicicleta, quem sabe?, qualquer um aprende, mas quantos têm vocação para serem ciclistas? São muitos exemplos que mostram que o "Dom", na verdade, é disposição de seguir em frente com o aprendizado, depois de já ter entendido o processo. Qualquer pessoa pode aprender a ler os 22 Maiores, ou escrever os significados nas cartas do baralho comum, ou ler os poemas do Petit Lenormand. Acho super válido, inclusive - sempre incentivei meus alunos a escreverem em suas cartas do baralho comum. Mas, assim como é didático, é limitante, per se. Pense nos Arcanos Menores do Rider Waite: ao mesmo tempo em que nos inspiram informações sobre a essência da lâmina, nos limitam por sua própria representação. E o que dizer da nomenclatura dada por Crowley para os Arcanos Menores? Sete de Ouros é sempre... Fracasso? E só isso? Seis de Paus é sempre Vitória... e só isso?
Nesse sentido, é que acredito na vocação. É o desejo de ir além do oferecido (graciosa e belamente) pelos ocultistas e autores anteriores a nós. É o desejo de vivenciar a experiência do Arcano. Para o conhecimento do Arcano, os processos intelectuais bastam. Para a sabedoria do Arcano, dependemos da vivência.
Nesse sentido, apresento a visão de Silvia Theberge e Carlos Godo, sobre os níveis de leitura das cartas. Sincronicamente, encontrei esse texto em um backup que fiz entre 2006 e 2007. Engraçado, não?

Nível Físico

Ao nível físico corresponde uma interpretação literal das cartas, ou seja, pelo seu conteúdo gráfico, sem grandes preocupações intuitivas, pouco dependendo do grau de conhecimento ou de sensibilidade do intérprete. Trata-se de uma forma de leitura mais superficial, mais epidérmica, por isso mesmo mais conforme aos problemas do nosso dia-a-dia (…). Enfim, está em relação direta com nosso lado material, biológico, racional. Constitui a forma de leitura mais corriqueira, aquela comumente empregada pelos cartomantes e curiosos em geral.

Nível Mental
No nível mental em que começamos a nos aprofundar em nossas fronteiras abstratas, a interpretação já se faz vislumbrando a ação das forças e leis que regem a natureza, o cosmo. Aqui, a intuição começa a se mostrar, e o consulente começa a perceber suas relações com o mundo ao redor (e não mais apenas com o intérprete), as grandes tendências de seu futuro, porém já em termos de auto-avaliação. As experiências estético-sensoriais vão ocupando espaços antes preenchidos por sensações unicamente orgânicas. Em suma, o nível mental é o elo de ligação entre os dois extremos – o material e o espiritual.

Nível Espiritual
O terceiro e mais profundo nível, o espiritual, só faz sentido para aqueles que já se voltaram para o caráter eterno do ser, aqueles para quem o mundo material, com todas as suas atrações, já não exerce influência, ou, pelo menos, não mais ocupa lugar de destaque na escala de valores. Essas pessoas, tendo já transcendido suas limitações materiais, preocupam-se com sua parte imortal, passando a ter (e ser) um canal aberto aos planos superiores. Em tal situação, o estudioso do Tarô tem sua intuição extremamente aguçada, estando em condições de estabelecer suas próprias normas de conduta e de decidir sobre quais aspectos de sua vida deve interferir para obter maior crescimento espiritual e energético. Rompeu o ego, libertou o eu…


E você? Em que nível está?

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Aniversário!!!



Hehehe, embora não seja muito fã desses lances de comemoração pelo fato de estar mais “velho”, lembrei-me hoje de um texto do Richard Bach (o autor de Fernão Capelo Gaivota, um dos livros mais lindos que já li), “Longe é um lugar que não existe”. O livro é deveras melhor, com ilustrações que enlevam qualquer criança, somado a uma mensagem que leva qualquer adulto a pensar sobre seu momento. Não tem uma conexão direta com a Cartomancia, mas leva-nos a pensar sobre o valor das palavras.


Acho que vocês já repararam que tenho pensado muito nisso.
Agradeço ao site Songs and Poems.





"- Rae! Obrigado por me convidar para a sua festa de aniversário!"
Sua casa fica a mil quilômetros da minha e viajo apenas pela melhor das razões. E uma festa para Rae é a melhor e estou ansioso para estar ao seu lado.
Começo a viagem no coração do Beija-Flor, que há tanto tempo você e eu conhecemos. Ele se mostrou amigo como sempre, mas ficou espantado quando lhe disse que a pequena Rae estava crescendo e que eu estava indo à sua festa de aniversário, levando um presente.
Voamos algum tempo em silêncio, até que finalmente ele disse:
- Não entendo muito bem o que você falou, mas o que menos entendo é o fato de estar "indo" a uma festa.
- Claro que estou indo à festa. - respondi. - O que há de tão difícil de se compreender nisso?
Ele ficou calado e só voltou a falar quando chegamos à casa da coruja:
- Podem os quilômetros separar-nos realmente dos amigos? Se quer estar com Rae, já não está lá?
- A pequena Rae está crescendo e estou indo à sua festa de aniversário com um presente. - falei para a coruja. Parecia estranho dizer "indo" depois da conversa com Beija-Flor, mas falei assim mesmo para que Coruja compreendesse.
Ela voou em silêncio pôr um longo tempo.
Era um silêncio amistoso, mas Coruja disse ao me deixar em segurança na casa da águia:
- Não entendo muito bem o que você falou, mas o que menos entendo é ter chamado sua amiga de "pequena".
- Claro que ela é pequena, porque não é crescida - respondi. - O que há de tão difícil de se compreender nisso?
Coruja fitou-me com os olhos profundos, cor de âmbar, sorriu e disse:
- Pense a respeito.
- A pequena Rae está crescendo e estou indo à sua festa de aniversário com um presente. - falei para Águia. Parecia estranho falar agora "indo" e "pequena", depois das conversas com Beija-Flor e Coruja, mas falei assim mesmo para que Águia compreendesse.
Voamos juntos sobre as montanhas, subindo nos ventos das montanhas.
E Águia finalmente disse :
- Não entendo muito bem o que você falou, mas o que menos entendo é essa palavra "aniversário".
- Claro que é aniversário. - respondi. - Vamos comemorar a hora que Rae começou e antes da qual ela não era. O que há de tão difícil de se compreender nisso?
Águia curvou as asas para a descida e foi pousar suavemente sobre a areia do deserto.
- Um tempo antes de Rae começar? Não acha que é mais a vida de Rae que começou antes que o tempo existisse?
- A pequena Rae está crescendo e estou indo à sua festa de aniversário com um presente. - falei para Gavião. Parecia estranho falar "indo", "pequena" e "aniversário", depois das conversas com Beija-Flor, Coruja e Águia, mas falei assim mesmo para que Gavião compreendesse.
O deserto se estendia interminavelmente lá embaixo e ele finalmente disse:
- Não entendo muito bem o que você falou, mas o que menos entendo é "crescendo".
- Claro que ela está crescendo - respondi. - Rae está mais perto de ser adulta, mais longe de ser criança. O que há de tão difícil de se compreender nisso?
Gavião pousou finalmente numa praia deserta.
- Mais um ano longe de ser criança? Isso não me parece ser o mesmo que crescer.
E Gavião alçou vôo e foi embora.
Eu conhecia o bom senso de Gaivota. Voamos juntos, pensei com muito cuidado e escolhi as palavras, a fim de que, ao falar, Gaivota soubesse que eu estava aprendendo:
- Gaivota, por que está me levando a voar para ver Rae, quando na verdade sabe que estou com ela?
Gaivota sobrevoou o mar, as colinas, as ruas e pousou suavemente em seu telhado e disse:
- Porque o importante é você saber a verdade. Até saber, até realmente compreender, só pode demonstrá-la em coisas menores, com ajuda externa, de máquinas e pessoas e pássaros. Mas deve se lembrar sempre que não saber não impede a verdade de ser verdadeira.
E Gaivota se foi.

E agora é chegado o momento de abrir o seu presente. Presentes de lata e vidro amassam e quebram num dia, somem para sempre. Mas eu tenho um presente melhor para você.
É um anel para você usar. Cintila com uma luz especial e não pode ser tirado por ninguém, não pode ser destruído. Somente você, no mundo inteiro, pode ver o anel que lhe dou hoje, como fui o único que pude vê-lo quando era meu.
O anel lhe dá um novo poder. Usando-o, você pode alçar vôo nas asas de todos os pássaros que voam.
Pode ver através dos olhos dourados deles, pode tocar o vento que passa pôr suas penas macias, pode conhecer a alegria de se elevar muito acima do mundo e suas preocupações. Pode permanecer no céu pôr tanto tempo quanto quiser, através da noite, pelo descer do sol; e quando sentir vontade de outra vez descer, suas perguntas terão respostas, suas preocupações terão acabado.
Como tudo o que não pode ser tocado com a mão nem visto com o olho, seu presente se torna mais forte à medida que o usa.
A princípio, pode usá-lo apenas quando está fora de casa, contemplando o pássaro com quem você voa.
Mais tarde, porém, se usá-lo bem, vai funcionar com pássaros que não pode ver, até que finalmente acabará descobrindo que não precisa do anel nem de pássaro para voar sozinho acima da quietude das nuvens.
E quando esse dia chegar, deve dar seu presente a alguém que saiba que irá usá-lo bem, alguém que possa aprender que as coisas que importam são as feitas de verdade e alegria, não as de lata e vidro.
Rae, este é o último dia especial de comemoração a cada ano que estarei com você, tendo aprendido com os nossos amigos, os pássaros.
Não posso ir ao seu encontro porque já estou com você.
Você não é pequena porque já é crescida, brincando entre suas vidas como todos fazemos, pelo prazer de viver.
Você não tem aniversário porque sempre viveu; nunca jamais haverá de morrer. Não é a filha das pessoas a quem chama de mãe e pai, mas a companheira de aventuras delas na jornada maravilhosa para compreender as coisas que são.
Cada presente de um amigo é um desejo de felicidade.
É o caso do anel.
Voe livre e feliz além de aniversários e através do sempre. Haveremos de nos encontrar outra vez, sempre que desejarmos, no meio da única comemoração que não pode jamais terminar.

Abraços, meus queridos. O aniversário é meu, a felicidade é para todos nós.