quarta-feira, 7 de julho de 2010

Sobre o gênero daquele que manipula as cartas

Olá pessoal. Como tá ficando difícil atualizar o blog, devido aos meus atuais compromissos – me formo no curso técnico em Conservação e Restauração de Bens Culturais da Fundação de Arte de Ouro Preto (FAOP) dia 10 de julho – estou aproveitando o parco tempo que tenho para escrever. Estou dentro de um ônibus. Pois bem, fora os solavancos, acho que esse post sai – na verdade, se você estiver lendo, eu obtive êxito na empreitada...
 

Estive pensando em algo que li no Caminhos do Tarô. As cartas comuns eram reservadas somente às mulheres e aos efeminados, enquanto os Arcanos Maiores eram reservados aos homens. Fiquei impressionado com tal afirmação, porque ela é lógica, do ponto de vista histórico. Eu fiquei pensando em como abordar algo que para mim soa lógico sem cair na homofobia nem na misoginia. Vocês dirão se eu consegui.
 

Questão de autocrítica: tenham em mente que, quando cito os gêneros, estou na verdade afirmando coisas acerca dos homens e mulheres dos séculos XVIII e XIX. A atualidade já tem os gêneros diluídos o suficiente para que tais análises estejam obsoletas, ou, se muito, a caminho disso.
A questão é: os homens são mais atraídos pelo poder, pela magia cerimonial (e por cerimônias de todos os tipos...) enquanto as mulheres estão mais interessadas no dito “futuro”. E que futuro é esse? Um bom casamento, filhos, segurança... estruturação.
Lembrem-se que os sistemas que hoje usamos são derivados daqueles desenvolvidos por homens e mulheres do século XIX, quando ninguém havia queimado sutiens ainda! (Ou espartilhos, que são mais cruéis e mais adequados ao período).
Lembremo-nos do conto A Cartomante, do Machado de Assis. A figura da mulher solteira que sobrevive do que consegue angariar fica evidente. E o que diríamos das afirmações de Antoine Court de Gebelin, que disse ter descoberto num maço de cartas, usado por moças para prever o futuro ou ver a sorte, os mistérios do Antigo Egito?
 

A subestimação do intelecto feminino fica evidente, quiçá ferina, numa afirmação como esta; ainda que, convenhamos, tenham havido nos dois últimos séculos intervenções de ambos os gêneros tanto na magia cerimonial com o Tarot quanto na divinação.
Na divinação, temos Etteilla, responsável pelo tronco comum seguido por toda a Cartomancia francesa. Outrora Alliette, fez fortuna com sortilégios e previsões, como boa Bruxa que seria... se fosse mulher!
 

Por outro lado, já no século XX, temos Pamela Colman Smith (cujo baralho desenvolvido em parceria com Arthur Edward Waite completou 100 anos), Lady Frieda Harris (parceira de Aleister Crowley na produção do Thoth’s Tarot) e Dion Fortune, talvez a maior cabalista cerimonial do século XX (se não for, certamente é a mais citada...)
 

Levando em consideração a contribuição dessas pessoas às áreas “reservadas” ao sexo oposto, voltamos à questão inicial: por que às mulheres e aos efeminados (que, em grande parte, partilham da intuição feminina somada à perspicácia investigativa masculina, ou seja, resultam em grandes cartomantes) eram reservadas as cartas comuns? Navalha de Ockhan: porque elas são diretas e precisas. Porque elas falam de um tempo curto – de dias a meses (há exceções: nas mãos de um bom cartomante, as previsões podem ser, realmente, de anos à frente). Porque elas falam do cotidiano. Porque elas se ligam ao lado mais prático e corriqueiro da vida. E mais: elas são acessíveis a qualquer um.
 

E por que seriam reservados aos homens os Arcanos Maiores? Porque são amplos e afeitos a metáforas e alegorias (sendo, eles mesmos, alegorias); porque não se assentam em nenhum culto, sendo passíveis de associação com vários deles; porque são filosóficos, na medida em que levam ao questionamento, mais que revelam acontecimentos; porque estão ligados à atemporalidade da ação – enquanto não se aprende uma lição, não se consegue partir para a seguinte...

E, parafraseando Starhawk, podemos encontrar facilmente em nossa memória cinco mulheres que se adequam às questões ditas "masculinas", e cinco homens que se adequam às questões ditas "femininas". Diante de um baralho, os gêneros se diluem.
Nessa medida, e tendo em mente a composição do baralho de Tarot, que é formado pelos dois grupos, trabalhar com ambos é uma chance inenarrável de trabalhar com os aspectos masculinos e femininos do ser, buscando a praticidade feminina relacionada com a visão de longo prazo masculina.
E vice versa.
Abraços a todos.
 
P.S.: Enquanto editava esse texto, encontrei esse artigo, do Marcelo Del Debbio. É, eu não estou sozinho nessa...

3 comentários:

  1. Emanuel, adorei esta postagem. Muita informação. Acho que essa rivalidade entre homens e mulheres vai continuar ad eternum, até por que isso é o que dá sabor a vida, certo? O problema é reconhecer a igualdade (atualmente o preconceito vem dos dois lados). Acho que homens e mulheres precisam se encontrar mais para poderem viver em paz, encontros de alma mesmo.

    Parabéns pela formatura. Que seja mais um andar no seu edifício do conhecimento, e que traga a vc sucesso e paz.

    Beijos no coração!

    ResponderExcluir
  2. Oi Paula. Obrigado, primeiramente, pelas felicitações - só quem termina uma fase sabe o alívio que isso dá...
    Essa postagem foi daquelas que vem em turbilhão, informação demais porque não sabia como dividir... Mas vou trabalhando melhor o tema aos poucos. Acho mesmo que deveríamos (homens e mulheres que somos) vermo-nos como complementares, não somente diferentes.
    Em todos os aspectos.
    Beijo grande!

    ResponderExcluir
  3. Oi, Emanuel. Td bom? É uma satisfação imensa ser seu novo amigo. Espero que possamos trocar idéias... amei este seu blog...Ótimo conteúdo!!!!!! Um abração.

    ResponderExcluir

Quando um monólogo se torna diálogo...