terça-feira, 30 de março de 2010

Dracula, de Bram Stoker

Olá pessoal. Mesmo me sentindo um Oito de Paus, não poderia deixar de publicar essa resenha, mesmo sendo aos 49’ do segundo tempo, evitando o golden gol. Hehe. Desde que entrei no desafio literário penso em como escreveria esse post, já que ele é, intrinsecamente, relacionado à cartomancia.
Sei que, ao afirmar isso, estou deixando diversos pontos de interrogação na sua cabeça. “Ué, mas cartomancia relacionada ao vampiro mais famoso de todos os tempos? Como?”
Vou tentar responder. ^^

A história narra a viagem de Jonathan Harker, um jovem advogado, para a Transilvânia, com o intuito de visitar um cliente, Conde Dracula. Nesse ínterim, Jonathan descobre que o dito conde esconde um sangrento e terrível segredo. Como destruí-lo antes que ele destrua seu mundo, seus familiares e ele mesmo; eis o desafio de Jonathan no desenrolar do livro.
A estrutura textual da obra é assaz interessante: são cartas, bilhetes, o diário de Jonathan, se intercalando e permitindo ao leitor que estruture as constatações dos personagens por sua própria conta. Não somos observadores da história, mas intervimos diretamente no desenrolar do fio que a norteia, de acordo com nossa perspicácia ao relacionar os dados. Foi muito interessante, para mim, seguir o enredo, pela minha profissão – historiador – lidar exatamente com isso: através de fontes documentais, estruturar um passado a partir dos elementos factuais que o norteiam no tempo e no espaço.


O autor, Abraham Stoker nasceu em Dublin (uma cidade de pensadores, sem dúvida), em 1847. Publicou Dracula em 1987. O que nos é interessante, na biografia de Stoker, é o fato do mesmo ser citado como um dos membros da famigerada Ordem da Golden Dawn (G.’. D.’.). Esta Ordem, que também possuiu como membros Arthur Edward Waite e Aleister Crowley, tinha como eixo o estudo de temas místicos, correlatos com o Tarot, sobretudo a cabala. Saber que Bram Stoker participou desse círculo de estudiosos indica que o mesmo conhecia as cartas. Talvez as jogasse – Who knows?

Por sua vez, o tema abordado – o vampiro – já é algo que habita o imaginário ocidental há muito tempo. Desde a publicação desta célebre obra, diversas releituras foram feitas, tanto na literatura quanto em outras artes. O vampiro, morto-vivo, demônio, sedutor, invencível em sua luxúria, é, ao mesmo tempo, sedutor e medonho; a ambição de viver para sempre, e a maldição de nunca mais viver, coexistem no ser que, por sua maldição pode usufruir do desejo de muitos dos mortais – transcender os portões das gerações, quiçá do tempo. O mito em si se refere a um personagem real – Vlad Tepes, o empalador.


Como é algo assaz conhecido, não me estenderei muito nesse ponto. Dracula, por sua vez, vem de Dracul, dragão, o monstro do Apocalipse. O sinal do Fim dos Tempos.


 Seu alimento, o sangue, é a seiva vital, a portadora da vida, que possui um poder mágico latente à mesma. Pactos de sangue, sacrifícios rituais, desde a aurora dos tempos a humanidade troca a vida de um pelo bem estar de todos. Por vezes bode expiatório – conforme vemos no Diabo do Tarot – por vezes Deus Feito Carne. O poder do sangue garante que a Tradição permaneça e que o planeta siga sua órbita pré-determinada.
Atualmente é raro termos notícia de rituais de sangue (pelo menos no meu círculo ^^). Outras formas de ampliar o poder, mais sutis e delicadas frente à violência da morte, são usadas para a transformação dos fatores inerentes aos eventos.


 Das versões do mito contemporâneas, sem sombra de dúvida as crônicas vampirescas de Anne Rice estão entre as melhores, sendo inclusive fonte para o posterior desenvolvimento do RPG Vampiro: a Máscara. A psicologia do monstro é sutilmente realçada em detrimento do terror que ele causa; suas motivações estão à frente de seus pudores. Quem ainda não leu, mas assistiu Entrevista com o Vampiro, pôde perceber a diferença entre Louis e Lestat, e a diametralmente oposta forma de agir deste comparada à de Armand. O monstro mítico é o mesmo, mas sua forma de agir é sedutoramente tripartida entre os três. E o que dizer da pequena, mas não menos demoníaca, Claudia?


O jogo da White Wolf explora esse aspecto, dividindo as personalidades em 13 clãs, com vantagens e fraquezas em relação aos outros, explorando todo o universo criado ao redor de Conde Dracula.


Nos games, temos a série Castlevania. Gerações de caça vampiros se alternam na inglória tarefa de adormecer o conde por mais cem anos. 


Na versão para Playstation 1, uma supresa: Alucard (suuuuper criativo o nome, não?), o filho do conde, decide enfrentar o pai. Ironicamente, ele pode usar uma cruz. 

No Brasil, tivemos as novelas Vamp e O Beijo do Vampiro. Acompanhei a primeira, como todo jovem da minha geração de mesma mentalidade (e acompanhei MESMO: Natasha... ai Natasha... *suspiro*), mas não a segunda. 


Diversos filmes se apropriaram do mito. No cinema mais recente, temos Van Helsing, cuja relação com Drácula reside apenas no nome do personagem, e Dracula, 2000 e 3000 (só vi o primeiro – diversas referências ligadas à White Wolf no que concerne à criação do personagem).
O que nos leva a mais up to date das representações do mito. A série Crepúsculo.


Antes que eu seja trucidado pelos fãs, um informe: deveria ter citado essa obra em fevereiro. É um conto de fadas, ainda que às avessas, da melhor qualidade para leitura despropositada. É leve, dinâmico e agradável. E viciante. Não posso negar.
Mas, se tomarmos por base o desenvolvimento do mito, o demônio que o vampiro representa, os horrores do post mortem sendo manifestados em carne putrefata que ainda vive, a sedução pecaminosa que corrói os sentidos, o arrastar para o inferno de não ter redenção nem neste mundo nem no outro, o que dizer de vampiros cuja virtude é inquestionável? Heróis...  from Hell?
É uma humanização do mito que nos aproxima de suas fraquezas, que são elevadas em seu aspecto humano, mas subdesenvolvidas para sua própria natureza; a Fome de um vampiro deveria ser incontrolável, ou mesmo, ao assumir uma nova natureza, o seu passado deixaria de existir como algo vital, ainda que importante. Temos vivenciado isso com nossos heróis em geral – vide Superman, e depois Smallville – mas, com nossos vilões? O maniqueísmo está deixando de existir como uma realidade factual. Algo a se pensar. Is it too ironic… don’t you think?
De qualquer forma, o mito do Vampiro está presente em nosso imaginário contemporâneo de forma indelével, pelo menos para esta geração. E neste sentido, alguns baralhos foram desenvolvidos com o intuito de explorar essa faceta de nossa psique. De maneira geral, vamos trabalhar esse personagem no Diabo, e o cenário na Lua; o temor feito carne no primeiro, o ambiente que gera o temor na segunda. 


O Tarot mais direto neste aspecto é o Tarô dos Vampiros, de Robert M Place, o mesmo criador do Tarô dos Santos. Neste, a iconografia explorada remete diretamente aos personagens de Dracula, sem perder de vista os caminhos paralelos que o mito assumiu. 

É importante explorarmos, com o devido cuidado, os nossos próprios aspectos sombrios. O mito do conde Drácula é uma das formas de nos depararmos com nossa Fera Interior, em sua faceta mais sombria. Mas não devemos tentar desacompanhados. Como se diz na TV: “Não tentem isso em casa, crianças”!

Um comentário:

  1. Boa noite carissimo, sempre gostei de histórias cujo tema fossem os vampiros, por um motivo bem simples: acho que somos assim, seres presos entre a verdade e a mentira, entre a razão e o sentimento, entre o desejo e a repulsa. E para mim eles representam exatamente isso.
    Leio tudo que posso acerca do tema e cada vez mais percebo que somos vampiros na vida e qdo conseguimos lidar com isso de forma natural, tudo fica mais sólido e menos exagerado. Como a lua negra que nos expõe diante de nós mesmos e nem sempre agrada o que lá está. Bjs carissimo

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Quando um monólogo se torna diálogo...